Município deve indenizar pais de surfista morta em rede de pesca

Em decisão inédita e por maioria, a 9ª Câmara Cível do TJRS condenou o Município de Cidreira por omissão diante da ausência de fiscalização e de delimitação das áreas destinadas ao esporte e à pesca na orla marítima. O ente público deverá indenizar os pais de Graziela Alegretti, surfista que morreu afogada após ficar presa em cabo de rede de pescaria nas águas da praia de Salinas. A reparação foi arbitrada em R$ 70 mil, correspondente a 200 salários mínimos, com correção monetária e juros legais.

Os autores da ação de indenização por dano moral apelaram da sentença que julgou improcedente a demanda. Sustentaram a responsabilidade civil do Município em razão da inexistência de sinalização indicativa de redes de pesca no local do acidente, ocorrido no dia 7/5/2000.

O relator do recurso, Desembargador Odone Sanguiné, destacou estar em vigência a Lei Municipal nº 628/1997, que dispõe sobre a demarcação das áreas de lazer, pesca profissional e amadora na orla marítima, durante a temporada de veraneio. Enfatizou, por outro lado, permanecer o mesmo dever da municipalidade fora do período de verão. “Pois, em que pese a menor movimentação de pessoas, remanesce o interesse local, inclusive em relação aos moradores das imediações.”

Conforme prova testemunhal, entretanto, nem no período de veraneio havia placas indicativas de demarcação das áreas delimitadas pelo poder público para a prática de esportes e de pesca. Somente após a tragédia a sinalização foi providenciada. “Logo configurada a omissão do Município na fiscalização”, afirmou o magistrado.

Legislação

Esclareceu que no caso da demanda, emerge a responsabilidade subjetiva do Município, incidindo o princípio geral da culpa civil nas modalidades de imprudência, negligência ou imperícia na realização do serviço público que casou o dano. “Entendo estar devidamente configurada a omissão do Município no que tange à falta de fiscalização e de indicação das áreas destinadas à pesca, presente o pressuposto da falta de serviço”, reforçou.

Salientou que remanesce a competência do Município em relação a assuntos de interesse local, prevista no art. 30 da Carta Magna, dentre os quais inclui-se a segurança dos freqüentadores das praias litorâneas. Esclareceu que a demanda difere de outras análogas, em que o entendimento da Câmara foi pela exclusão da competência legislativa do Município para legislar sobre direito marítimo.

Lembrou também que a Lei nº 9.615/98 – do Desporto – dispõe ser o mesmo direito individual do cidadão. Estabelece dentre outros princípios o da segurança, propiciado ao praticante de qualquer modalidade desportiva, quanto a sua integridade física, mental ou sensorial. Trata também do Sistema Brasileiro de Desporto, com a participação dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, de forma autônoma e em regime de colaboração.

Sob esse prisma, concluiu ser irrelevante que a Lei Estadual nº 8.676/88 – determinando a obrigatoriedade dos municípios demarcarem as respectivas áreas de lazer e de pesca -, não tenha sido recepcionada pelo ordenamento constitucional vigente. No mesmo contexto, que a Lei Municipal nº 773/89 de Tramandaí tenha sido declarada inconstitucional. No caso, frisou, “o Município de Cidreira regulamentou a matéria, evidenciando o interesse da municipalidade com a segurança dos freqüentadores do balneário”.

A Desembargadora Marilene Bonzanini Bernardi acompanhou o voto do relator, levado à sessão de julgamento no dia 18/4. Revelou estar convencida que, de fato, há interesse local do município que lhe legitima legislar na competência residual que lhe é assegurada constitucionalmente. “Tanto o é, que editou norma específica, restringindo, contudo a demarcação a períodos de veraneio, falhando, pois, no seu propósito.”

Voto divergente

Votando em sentido contrário, a Desembargadora Iris Helena Medeiros Nogueira, reiterou que a lei municipal de Tramandaí nº 773/89, para regular a demarcação imposta pela Lei Estadual nº 8.676/98, foi considerada inconstitucional pelo Órgão Especial do TJ. O fundamento é de que não teria o município competência para legislar sobre temas de direito civil, que seria atribuída exclusivamente à União.

Para a magistrada, também não remanesce o dever da municipalidade de demarcação imposto pela Lei Estadual nº 8.676/98. Em seu entendimento, tal legislação não foi recepcionada pela Constituição Federal do mesmo ano e nem pela Constituição Estadual de 1989. Afirma, assim, ser de competência privativa da União legislar sobre qualquer assunto referente a praias marítimas, plataforma continental, mar territorial e terrenos da marinha.

Registrou compadecer-se, como os demais componentes da Câmara, com a situação difícil por que passaram e passam os autores da ação. “Contudo, o Poder Judiciário tem a função primordial de aplicar a lei ao caso concreto.”

Fonte = Correio Forense

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